O melhor da viagem é sua preparação: conferir itinerários, escolher os passeios e pensar nas guloseimas que serão degustadas. Para o Carnaval, vale o mesmo. Normalmente nos encantamos com as expectativas, possibilidades abertas e ansiedades gostosas diante das novidades. O deleite que antecipa o prazer também é verdadeiro e intenso. Muitas vezes, inclusive, mais gostoso do que a alegria posterior.
São coisas da nossa natureza, propensa a se alimentar de antecipações e a planejar possibilidades que levem à felicidade, ao contentamento e às realizações. É nossa força espiritual nos impulsionando, fazendo-nos vibrar com desprendimento e deixando uma marca produtiva, que transforma o mundo ao redor.
Essa força da ação, válida para qualquer contexto prático, se destaca nesse momento em que a nossa mais genuína festa se avizinha. Carnaval é o momento de deixar movimentar nossa capacidade de alegria, abrir espaço para descansar um pouco da seriedade com que encaramos as coisas e nós mesmos, sem, todavia, esquecer do exercício amadurecedor de se saber ciente e reconhecer que se trata de curto espaço de tempo, rápida passagem, breve duração de uma proposta que reconduz à normalidade. Uma normalidade retificada, menos opressora e mais amena na simples compreensão de que outras felicidades virão.
Deve ser para alongar a diversão que as pessoas, com o coração balançando de júbilo, adoram preparar a fantasia com esmero, ensaiar o samba-enredo, melhorar o molejo no pé e a cadência no tamborim. Para nós, o Carnaval é mais do que um simples festejo. É também manifestação popular, demonstração de cultura, um modo muito especial e particular de olhar a realidade e compreender a vida, de modo a valorizar estratégias bem brasileiras.
Nesses dias que preparam a explosão do batuque, é com aflição produtiva que nos perguntamos: ¿o que será que vai rolar?¿ Como no jogo da vida, em escala menor, as surpresas e decepções dos dias de folia deverão ser acolhidas com sabedoria. Lágrimas e exultações fenecem na quarta-feira ¿de cinzas¿. Viagem feita, teremos as memórias que para sempre ficarão. A fantasia, anos no fundo do armário, poderá até ser roída pelo tempo, mas aquela recordação especial, jamais desaparecerá.
